Continuam pululando por aí seres cheios de sabedoria, tão cheios de certezas e de «eu acho que...», tão cheios deles próprios e da magnífica ideia que querem dar de si, que é bem provável que um dia destes rebentem numa nuvem de pó e que, após o arejamento imprescindível, se resumam a uma ínfima imagem de vergonha por se recusarem a aceitar a sua condição de meros mortais, não muito diferentes dos outros todos que eles criticam e aconselham com presunção.
O calor abrasador e repentino que me põe exausta com o mínimo esforço físico (ó pra mais um brinde do Síndrome de Cogan, comum a outras doenças auto-imunes, como a Esclerose Múltipla - oi M.! -, o Lúpus -oi, Lytha do http://diariodeumaborboleta.blogs.sapo.pt/ - e a Doença de Crohn - oi M.! -, para só mencionar as mais conhecidas!) e que , literalmente, me torra os miolos, impede-me de ter pachorra para tão sábios seres que ousam viver a vida dos outros melhor que os ditos, à força de se recusarem a viver as suas próprias! Lamento o tom agressivo, mas realmente a paciência, que nunca foi muita, começa a escassear! Sei há muito que não sou nem um pouco perfeita e embora muitas vezes isso não me agrade, já não é com tanta ligeireza que ouso opinar sobre o que cada um faz (excepção feita aos mais chegados e nem sempre!), pois descubro frequentemente que sou capaz de cometer os mesmíssimos erros.
Vivemos, de facto, numa época em que todos nos achamos com direito a emitir juízos de valor sobre os assuntos mais variados, com a mesma facilidade com que, por enquanto, abrimos a torneira para beber água; como dizia um professor que tive, «Hoje há especialistas em tudo e em coisa nenhuma; vão a qualquer jornal televisivo e dão a opinião sobre tudo, ainda que, muitas vezes, comecem por dizer bem, apesar dessa não ser a minha área, penso que.... Então, se não é essa a sua área, para que é que dão uma opinião, não me dirão?». Pois, professor, não sei bem por que razão o fazem, embora desconfie de que realmente são especialistas de «coisa nenhuma», ou melhor, são especialistas em não saber (con)viver consigo próprios!
A CONTAS COM A TREVA
Que ninguém diga que nasceu
como nasceu a água, o fogo ou o vento.
Que ninguém diga que pertence
à raiz, à fonte ou ao labirinto das vozes.
Que ninguém fale do que não sabe,
sob pena de errar e de mentir
para além do limite do que é tolerável.
Só de cima de um ramo alto e verde
se pode perceber a extensão do rio,
a imensidão da planície, a tentação do longe
desafiando os poderes da visão.
Um pássaro não pertence ao céu,
nem o poema a um poeta.
Tudo é mais complexo e desnorteante,
podendo a simplificação conduzir
à loucura ou mesmo à morte.
Passa a água por onde passa a luz da estrela,
por onde passa o sulco de um amor antigo,
a dor de uma ferida que o tempo não sarou.
A morte é sempre atrás das janelas
que se pressente e se vigia, como um peixe
agonizando na solidão circular de um aquário.
Esta noite está morna e húmida
como um corpo depois da entrega total,
e essa é a única maneira que tem
de esconder a miséria de estar só,
a contas com a treva, no meio do universo.
José Jorge Letria, O Livro Branco da Melancolia
Nós, que ouvimos também com os olhos!
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